Tarde fria aquela, em Monte Verde, cidadezinha que há muito desejávamos conhecer. Resolvemos ficar até o dia seguinte, atraídos que fomos pelo seu encanto. Porém, não encontramos lugar nem no hotel nem nas pousadas. Informaram-nos que estava tudo lotado por causa da festa da Maçã, que iria começar no dia seguinte.
Então, resolvemos tomar um lanche e enfrentar a estrada de volta. Na lanchonete, o rapaz que nos atendeu confirmou a falta de vagas, mas indicou uma senhora que sempre dava um jeito, hospedando pessoas nos feriados prolongados.
Era perto e lá fomos bater à porta, que, quando se abriu, deixou escapar uma onda de calor com um cheiro indescritível de maçãs no forno. Algo morno, açúcar e canela se confraternizando com maçãs numa dança que contrastava com o vento gelado de fora.
Muito simpática, a senhorinha nos ouviu e disse que infelizmente não poderia nos receber porque estava hospedando uma sobrinha no quarto disponível.
– Mas, podem deixar! Vou levar vocês ao bairro operário, onde meu compadre tem um lugar especial para acomodar hóspedes.
Meu marido e eu nos olhamos, surpresos com tanta solicitude e ela pediu licença para desligar o forno. Jogou um xale de lã nas costas e entrou em nosso carro para nos mostrar o caminho. Já era noite e caía uma garoa fria e incômoda.
Sempre tagarelando, disse que estava preparando tortas, bolos e apfelstrudel para vender na Festa da Maçã, ajudada pela sobrinha.
Quando soubemos que não dispunha de condução para levar os quitutes ao local da festa, o Gilberto ofereceu-se para fazer isso para ela. Ah! Como ela sorriu feliz e agradecida! Tínhamos nos conhecido há menos de quinze minutos e já nos tornáramos anjos uns dos outros!
Encontramos um quarto novo, bem confortável, com lareira e tudo! Fomos levá-la de volta e ela nos fez entrar e tomar chá (de maçã, naturalmente!) com pedaços de torta de sabor e aroma incríveis.
Foram três dias que passamos lá, comendo bem, nos divertindo e desfrutando a companhia de pessoas agradáveis.
Entendo muito bem Marcel Proust, quando declara que o sabor das madeleines com chá despertou nele lembranças profundas da infância, que retratou na famosa obra “Em busca do tempo perdido”
Aprendi a fazer bolo e torta de maçãs (não me atrevi a tentar o apfelstrudel…) e toda vez que aquele aroma se desprende pela cozinha e invade a casa toda, lembro-me daquela senhorinha. Nunca mais a vimos e nem sei se ela ainda está entre nós, mas a recordação daquele dia, há mais de trinta anos, está muito viva em mim.
Aroma de maçãs ao forno me lembra calor humano, sorriso, compartilhamento, solidariedade, enfim. Aí me ponho a a pensar: Que aroma associado a mim produzirá ternas recordações nas pessoas com quem convivo? Garanto que vou descobrir!