Recordações

Velhinhos no portão

Written by Zeneide

 

A casa era pobre, jardinzinho com cerca de arame farpado e um portão de madeira desbotado pelo tempo. Todas as manhãs passávamos por lá, minha amiga Maria Sílvia e eu, a caminho da escola. Ambas bem estudiosas, geralmente íamos repassando alguma matéria de prova. Mas, muitas vezes – ninguém é de ferro – tagarelávamos sobre nossos sonhos de adolescentes. A imaginação da minha amiga era surpreendente; tinha até um diário, onde registrava seus sonhos mirabolantes (e lia para mim!). Eu, mais introspectiva e pé-no-chão, me divertia, ouvindo-a.

Quando chegávamos perto da tal casinha, infalivelmente víamos o casal de velhinhos (Quantos anos teriam? Para nós, naquela época, qualquer pessoa acima de cinquenta anos era muito velha…).  Ela lhe entregava uma sacolinha com a marmita e ele se despedia com um beijo na testa. Enquanto ele descia pela calçada, ela permanecia ali até ele acenar quando virava a esquina. Só depois fechava o portão e entrava em casa.

Aquele ritual se repetia sempre e nós achávamos lindo, muito romântico aquele casalzinho. Comentávamos, então, como seria bom se também encontrássemos alguém para amar e envelhecer junto, conservando a ternura no decorrer do tempo.

Hoje, em plena envelhescência, sou grata a Deus pelo bom companheiro de longa jornada, pelos filhos, pelo genro e pela nora. E  também pela esperança de ser abençoada com netos.

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Publiquei este texto há mais de uma década. Hoje, dia em que recordo a partida do Gilberto (cinco anos, meu Deus!) sinto muita saudade, sim, mas também gratidão pelo tempo compartilhado. E me alegro pelas quatro bênçãos que chamo de netos, que acrescentam vida à minha vida.

Teria o mesmo acontecido com aquela minha amiga, de quem não tenho notícias ?

About the author

Zeneide

Meu nome é Zeneide Ribeiro de Santana, professora de Língua Portuguesa e Literatura. Já sou aposentada e aproveito meu tempo lendo bastante e tricotando um pouco.

6 Comments

  • O que escrever e como escrever para uma pessoa tão especial e iluminada?
    Zeneide, você é um anjo que ilumina nossas almas e nossas vidas!
    Adorei o blog!
    Muitos beijos… saudades…

  • Quanta gentileza, amiga! Muito obrigada. Também estou com saudades.
    Beijo. Deus te abençoe.

  • Tia Zeneide, Parabéns! Que tal lançar um livro com esses textos maravilhosos? Bjs

    • Agradeço muito, Ana Paula, mas acho que não é para tanto… Vou continuar a escrever , só tenho medo que vire um blog de memórias… Beijo.

  • Hoje, consegui um tempinho p/ ler um de seus textos… indicados por sua/nossa amiga Tirza, gostei muito e tenho certeza que gostarei dos outros. Curto muito isso! Obrigada por preencher esse nosso mundo virtual com coisas tão reais e saborosas. Abç

    • Oi, Lucia Helena! Muito obrigada pelo comentário tão gentil. Se você é amiga da Tirza, só pode ser “do bem”. Gosto muito dela, de longa data… Grande abraço.