Cotidiano

O nó e o sonho

sinhá Vitória

 

“Vidas Secas” é um romance impressionante, tanto pela temática, como pela linguagem concisa do autor e pela primorosa construção das personagens.

Sinhá Vitória, mulher forte, rude, acostumada à vida miserável de retirante, tem seus sonhos. Consegue idealizar um futuro melhor para os dois filhos, longe da seca. Para si mesma, parece ter um único desejo: uma cama onde possa descansar das duras  lidas diárias. Ela e o marido dormem num jirau, feito de varas rústicas, mais desconfortável ainda por causa de um nó na madeira, bem no meio, que a impede de se movimentar. Sonha poder comprar uma cama de couro, igual à do Seu Tomás da bolandeira. Pensa tanto nisso que essa ideia vai se tornando obsessiva.

Lembro-me de como desejei ter uma bicicleta na minha infância. Mesmo sabendo que não a teria, era bom sonhar, imaginar passeios naquele  bairro sossegado, desafiando o vento da tarde… Isso me faz pensar nos sonhos de consumo modernos. bem diferentes. Parece que não há limites para o que as pessoas almejam, diante de tantas  tentações, tecnológicas ou não.

Já falamos ou ouvimos “Não sei como presentear aquela pessoa; ela já tem tudo!” Tarefa complicada! Uma senhora que viajou ao meu lado, contou -me que estava acabando de pagar o presente de Natal do filho, comprado por sugestão da nora. Dizia-se arrependida pela fortuna que gastara naquela camisa do “jacarezinho”, nem tão bonita assim!

Quando se trata de viajar em busca de aventuras, lazer ou conhecimento, até dá para entender. Mas colecionar objetos que logo se tornarão obsoletos ou descartáveis… Bem, cada um sabe de si.

  • Enquanto isso, sonho com um tempo de menos fome, menos injustiça, mais segurança e mais paz na Terra. E conscientizo-me, cada vez mais, de que devo fazer algo a respeito. Não apenas sonhar, como Sinhá Vitória. Se fosse comigo, daria um jeito para que o Fabiano removesse aquele nó horroroso. Com minhas humildes desculpas, Graciliano Ramos!

About the author

Zeneide

Meu nome é Zeneide Ribeiro de Santana, professora de Língua Portuguesa e Literatura. Já sou aposentada e aproveito meu tempo lendo bastante e tricotando um pouco.

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