Um número de canto

Por: Zeneide Ribeiro de Santana

Definitivamente, ele não tem o dom da música. Mas, isso nunca o impediu de acalentar um sonho: apresentar um grande número de canto, num auditório.

E a oportunidade ocorreu num “Show de Talentos”, quando estava no primeiro semestre da Faculdade. O apresentador era um colega a quem tinha emprestado livros e apostilas e que não teve coragem de recusar-lhe o favor. Mesmo sem estar inscrito, o amigo o “encaixou” no programa.

Tudo ia bem: banda de rock, dança, dublagens… Ele estava ali à frente, bem na primeira fila, já bem nervoso, quando o apresentador anunciou:

– E com vocês, agora, um grande número de canto! Pode subir, meu amigo!

Tropeçando nos degraus, subiu ao palco, carregando um enorme cartaz enrolado. Bem devagar, foi até o canto do auditório e abriu o dito cartaz, onde escrevera “novecentos e noventa e nove trilhões, novecentos e noventa e nove bilhões,  novecentos e noventa e nove milhões, novecentos e noventa e nove mil, novecentos e noventa e nove”. E ainda conseguiu dizer:

– Eis aqui, senhoras e senhores, o meu grande número de canto!

Claro que o vaiaram em todos os tons possíveis e também não faltaram xingamentos, alguns pesados. No meio, uns poucos aplausos esparsos, abafados por novas vaias.

Mas, o melhor vocês não sabem! Ele, que estava à procura de emprego, foi abordado por um senhor elegante, pai de um colega de turma.

-Você tem talento! Gostei do seu número! – foi logo dizendo.

Quis saber quem havia feito o cartaz . Então, elogiou o traçado dos numerais manuscritos e lhe ofereceu um emprego para confeccionar cartazes de preços promocionais do seu supermercado.

Agradeceu e aceitou na hora!

Não vou concluir contando que hoje ele é o gerente do supermercado, porque não é verdade. Também não se tornou professor de Matemática. Vou deixar sua profissão atual a cargo da imaginação de cada um.