Cacos

A palavra caco tem sentido depreciativo: fragmento ou pedaço quebrado de louça, barro, ladrilho, telha, vidro, mármore etc.

Caco é parte, não representa mais a unidade, não tem serventia, está pronto para ser descartado, a não ser que alguma mente criativa se disponha a reutilizá-lo na reciclagem ou na confecção de um objeto de arte.

Na gíria, significa estar muito cansado mentalmente ou fisicamente. “Estou um caco!” – diz a pessoa exausta, sem forças para qualquer atividade. Ouvimos também “Ele(a) parece um caco!”, referindo-se à aparência acabada, ao desânimo, à falta de perspectiva de alguém diante de uma situação desfavorável.

Fernando Pessoa assim se expressa:

APONTAMENTO

A minha alma partiu-se como um vaso vazio.
Caiu pela escada excessivamente abaixo.
Caiu das mãos da criada descuidada.
Caiu, fez-se em mais pedaços do que havia loiça no vaso.

Asneira? Impossível? Sei lá!
Tenho mais sensações do que tinha quando me sentia eu.
Sou um espalhamento de cacos sobre um capacho por sacudir.

Que triste! Definir-se como um espalhamento de cacos sobre um capacho que deve ser sacudido! Destruiu-se o vaso, que apesar de vazio, ainda estava inteiro… Quanta intensidade nessa amarga autodepreciação!

Se você, como eu, já se sentiu um vaso quebrado, sem utilidade, está convidado a recordar o texto de Jeremias, em que o oleiro, ao ver o vaso quebrar-se em sua mão, toma os pedaços e faz deles um outro vaso. Então, o Senhor diz ao profeta que a casa de Israel é como o barro nas mãos do oleiro, o próprio Senhor.

Que possamos afirmar, sinceramente, como a letra da canção:

“Eu quero ser Senhor amado,
Como um vaso nas mãos do oleiro
Quebra a minha vida e faze-a de novo
Eu quero ser, eu quero ser um vaso novo”

E, sobretudo, crer no poder restaurador desse Oleiro, que não apenas refaz, mas direciona para novos caminhos, para as veredas da justiça e proporciona oportunidades de renovação.