Não convidei, não ouvi baterem à porta nem o som da campainha, mas ela entrou não sei como… E aqui está instalada confortavelmente, mesmo diante da minha cara de poucos amigos…
Dia nebuloso, um friozinho que me afasta até da janela, meu único contato visual com o mundo lá fora… E me vejo obrigada a fazer sala para essa hóspede indesejada, a encarar sua presença. Veio para quê? Bem, já que se apossou desse espaço como se dona dele fosse, fique à vontade… Mas passe apenas um tempinho pois não estou com disposição para aturar permanências…
Vamos olhar fotos antigas, que é seu passatempo favorito. Depois, por favor, pode se retirar… E, se puder, não tenha pressa para voltar aqui!
Sou grata pelas lembranças mais recentes de sons e imagens e de rostinhos de crianças, de olhares puros e risonhos que aquecem meus dias. Por favor, saudade, dê um tempo, pois preciso curtir esses dias que me restam. Sei que me tornarei memória no coração de meus netos, por isso preciso de espaço e de um pouco mais de tempo, apenas o suficiente. Que assim como eles são meus raios de sol, no futuro possam se lembrar com alegria desta avó friorenta, mas com o coração dolorido de tanto amor.
Dizem que a memória é o espaço em que as coisas acontecem pela segunda vez… Então, hoje está sendo um dia de grandes reprises, algumas engraçadas, muitas felizes, outras nem tanto, como é normal na vida da gente. Até parece que “estou num daqueles dias em que nunca tive futuro“, como escreveu Fernando Pessoa.
Enfim, saudade, agradeço sua visita. Valeu! Até mais!
