Não consigo imaginar o impacto visual, auditivo e emocional das pessoas atingidas pela tragédia do rompimento daquela barragem.
Como pode alguém, talvez na tranquilidade da hora do almoço, supor que dali a segundos tudo iria se findar? Penso nos pais de família, olhando com ternura as fotos dos filhinhos no celular, na jovem sonhadora tentando ligar para o namorado, na mãe agendando um horário no dentista para a filha, depois do expediente…
Talvez crianças em férias brincassem nos quintais, cães descansassem sonolentos nas soleiras das portas; pessoas da mesma família cuidando da horta, se preparando para comer o viradinho à mineira da marmita; donas de casa esperando seus queridos para servi-los com carinho… Pode ser que o gado estivesse pastando preguiçosamente, abrigado à sombra das árvores para fugir do calor escaldante…
E então, o ruído repentino, que ninguém conseguia identificar, o horror em forma de enxurrada de lama surge abruptamente de forma inexplicável. Algumas frases de sobreviventes:
– Pensei que era uma carreta chegando – disse a moça que foi resgatada dos escombros pelo marido e vizinhos.
– Ouvi barulho de árvores se quebrando e caindo…
– Só quando vi a lama arrastando tudo é que me caiu a ficha…
Esse susto, esse assombro, só quem viveu pode saber. E quantos partiram sem entender nada!
Perplexidade! Não encontro outra palavra para descrever a ocorrência. Comoção, compaixão pela dor alheia se misturam à revolta pela displicência dos que deveriam mas não se responsabilizaram pela prevenção que poderia evitar essa tragédia.
Mas, também me cutuca o cérebro algo que incomoda e me chama à realidade que procuramos ignorar: a iminência da morte. Creio que ninguém esperava o rompimento da barragem naquele momento, entretanto sabemos muito bem que a morte pode chegar a qualquer instante para cada um de nós.
Sobre o assunto, assim se expressou Manuel Bandeira no poema “Consoada”
“Quando a Indesejada das gentes chegar
(Não sei se dura ou caroável),
talvez eu tenha medo.
Talvez sorria, ou diga:
— Alô, iniludível!
O meu dia foi bom, pode a noite descer.
(A noite com os seus sortilégios.)
Encontrará lavrado o campo, a casa limpa,
A mesa posta,
Com cada coisa em seu lugar.”
É bom pensar nisso sem se esquecer de orar por Brumadinho!