Cotidiano Lições

Momento num café

Written by Zeneide

Quando o enterro passou
Os homens que se achavam no café
Tiraram o chapéu maquinalmente
Saudavam o morto distraídos
Estavam todos voltados para a vida
Absortos na vida
Confiantes na vida.

Um no entanto se descobriu num gesto largo e demorado
Olhando o esquife longamente
Este sabia que a vida é uma agitação feroz e sem finalidade
Que a vida é traição
E saudava a matéria que passava
Liberta para sempre da alma extinta.

(Manuel Bandeira)

Velório, enterro, cemitério… palavras impregnadas de tristeza… Tempos atrás, o velório era nas casas e as pessoas acompanhavam o caixão, geralmente carregado por familiares e amigos, pelas ruas até o cemitério. Caminhada difícil! Essa é a cena evocada pelo poema de Manuel Bandeira.

Também era a época em que homens usavam chapéus e os retiravam da cabeça para cumprimentar senhoras ou demonstrar respeito diante de uma procissão religiosa ou fúnebre. O momento retratado no texto é marcado por atitudes contraditórias: a da maioria, que está tão envolta pelo dia-a-dia e reage mecanicamente e a do homem que se destaca pelo gesto respeitoso de saudação ao morto. Interessante a maneira como essa atitude foi interpretada e caracterizada, como a de alguém que sabe da fragilidade da vida e da inexorabilidade da morte.

Mudaram os costumes, a forma de velar e enterrar as pessoas, mas acredito que o doloroso sentimento da separação continua quase o mesmo. Com algumas exceções, a dor da despedida final atinge profundamente familiares e amigos, especialmente quando a morte foi repentina. O impacto pode ser imenso e causar sequelas físicas e emocionais.

Entretanto, na atualidade, com esta pandemia, está tudo muito mais complicado. Quantas vidas perdidas! Não apenas idosos estão partindo abruptamente, sem se despedir, sem receber o carinho da família, sem acompanhamento e sem nehuma oração!

Que, assim como aquele homem no café, que foi sensível à passagem do morto, possamos refletir sobre a efemeridade da vida e também sobre como anda nossa alma, que não será extinta, como diz o poema – assim creio!

Que nossa esperança na vida eterna ande de mãos dadas com a fé em Jesus Cristo para nos conduzir serenamente ao lar celestial!

 

About the author

Zeneide

Meu nome é Zeneide Ribeiro de Santana, professora de Língua Portuguesa e Literatura. Já sou aposentada e aproveito meu tempo lendo bastante e tricotando um pouco.